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- Tudo começou pela fresca com Kikas a bater o rookie Connor O'Leary
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Foi um dia histórico para o surf nacional. Foi pura arte, aquilo que os nossos olhos assistiram esta terça-feira ao longo do dia – é verdade, num fuso horário decente. Frederico Morais escreveu, desenhou, grafitou, estampou – e por aí fora... - uma das páginas mais douradas páginas do surf nacional nas míticas paredes de Jeffreys Bay. Mas o dia também foi histórico para o surf mundial. Uma jornada daquelas em cheio que fica difícil traduzir em palavras e onde, muito provavelmente, vamos cometer a injustiça de deixarmos algum pedaço soberbo desta história de fora.
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Tudo começou pela fresca com Kikas a bater o rookie Connor O'Leary – o único estreante que ará ao presente momento da temporada tem estado acima do português - num duelo de cariz extra decisivo. Para não julgarem que só sabemos cair em lugares comuns e elogios baratos, foi um dos piores duelos do dia. Kikas estava nervoso e fez más escolhas de ondas. Valeu o facto de o seu frontside levar a melhor frente a um goofy.
Mais tarde, percebeu-se que a escolha de prancha não foi a ideal. Os surfistas haviam trocado as pranchas por maiores, depois de verem as primeiras bombas da manhã, mas naquele heat não entrou nada digno de registo. A verdade é que mesmo ligeiramente abaixo do seu melhor nível, Frederico ganhou e isso é que interessa. Para quê surfar lindamente como fez contra Julian Wilson no Brasil e depois perder por 10 centésimos? Maradona também sempre disse nunca se ter importado de marcar aquele golo com a mão à Inglaterra... Ganhou e é isso que interessa.
Numa aula de história...
Por um lado, as coisas correram na perfeição, porque não fizeram soar o alarme para os adversários. Apesar de todos admitirem que o surf de Kikas é letal em J-Bay, o português ainda não tinha entusiasmado definitivamente. Ainda bem que não... Mas antes de irmos à história em português, temos de falar da história em sul-africano. Melhor, em linguagem universal. Tudo por obra de Jordy Smith, já depois de John John ter abusado das direitas sul-africanas e enviado Jadson Andre para casa.
É então que o gigantão sul-africano decidiu fazer história. Mas história a sério. Pode não parecer, mas Jordy estava a sentir algumas dificuldades com um Leo Fioravanti que está em crescimento nas últimas etapas. Mas nas duas últimas ondas arrumou a questão com duas notas 10. A sério. Foi mesmo verdade. Foi a décima ocasião em 40 anos de história de surf mundial que um surfista fez um heat perfeito. Smith foi o sexto a fazê-lo. O primeiro a conseguir em J-Bay.
É aqui que entramos noutra dimensão da história. É impossível explicar como Jordy cometeu tal proeza. Podemos descrever os carves monstruosos, os laybacks surreais, os tubos que só ele sabe onde os apanhar e até a combinação disto tudo numa só onda. Mas explicar continua a ser difícil. Se, felizmente ou infelizmente, tiveram a disciplina de História na escola, sabem bem que é impossível tirar um 20 num exame da disciplina. É mesmo. É impossível alguém saber tudo ao pormenor. Fica sempre algo por explicar tantos contornos e meandros históricos. Vá lá que aspirem ao 19 e já vão com sorte. E se há onda no circuito que se assemelhe a um exame de História é J-Bay. Caramba, há sempre algo a mais por fazer. Se um 10 já é algo absurdo, imaginem dois. Seguidos.
No campo da excelência
A partir deste heat houve cada vez mais nível na água. Julian mostrou que também é marrão e sacou mais um 10 no heat seguinte. Esta malta anda toda aplicada nos estudos, certamente. Já Conner Coffin limpou Parko com grande pinta e tornou-se no terceiro lycra azul do dia a vencer. Só Kikas e Joan Duru, que eliminou Adriano de Souza se podem orgulhar do mesmo.
O que significa que os favoritos estão a impor a sua lei em Jeffreys. Com exceção de Kelly que saiu lesionado antes do tempo, e de Mineiro e Parkinson, a artilharia está toda ainda na luta pelo triunfo final e está a surfar nas horas, exercendo o seu estatuto de favoritos. Contudo, isso foi só até ao segundo heat da 4.ª ronda. Aí a aula de história foi dada em português.
Antes disso já Wilko havia avançado silenciosamente para a 4.ª ronda, mostrando que vai ser difícil atirá-lo ao chão. É verdade, quem diria, duas épocas na luta com os melhores. Tal como Medina que abriu a nova ronda com um tratamento à antiga frente a Duru e Owen, ficando ambos em combinação. Chegava a vez de Kikas.
A verdade é que não havia qualquer pressão sobre o surfista português. Pela frente tinha "só" John John Florence e Mick Fanning. Tudo o que fosse acima da derrota já era positivo. Não pelo Kikas, mas por estarmos a falar do campeão mundial em título e de um tricampeão mundial que já venceu por quatro vezes em Jeffreys, inclusivamente no ano passado, sendo um dos maiores especialista da onda – e só não venceu mais uma por causa do amigo tubarão...
Nem com um 10...
Mas a história é passado e no presente o que conta é a ação. Kikas utilizou aquela tática que tanto gosta, de abrir com tudo. Atirado o nervosismo às malvas, Frederico começou a soltar-se e logo na primeira onda deu festival, com um 9,60 pontos, saindo bem na frente de uma primeira troca de ondas inicial. Surreal. Mas com aqueles monstros na água ainda nem meio caminho estava percorrido.
A verdade é que John John espetou-lhe mais um 10. Assim como se fosse fácil. Sem suor. Só naquela do puro talento. E a forma como embala dentro do tubo, quase sem se mexer para dar balanço? Não há palavras. Mas Kikas não baqueou e a meio do heat fez o primeiro 10 no World Tour. Bem, os juízes não acharam, mas guardemos na memória aquela onda que ainda saiu abaixo da primeira: 9,47. Estava em brasa e imparável.
Mas Fanning respondeu de seguida e recebeu um prémio carreira dos juízes, que lhe ofereceram literalmente um 9,73, ajudando-o a sair de combinação. Era necessário atenção redobrada pois tanto Fanning como John John tinha requisitos pouco acima do 9. O que para estas "bestas" e naquelas condições de mar é quase como pedir um 6 a qualquer outro surfista numa onda acessível.
No entanto, Kikas esteve ímpar a controlar o heat até final. Fez-se história, pois. Foi a maior vitória portuguesa naquele palco. Frederico Morais chega mais uma vez este ano aos quartos-de-final, depois de o ter feito em Bells Beach. Fez o maior score da sua ainda curta estadia na elite mundial – sim, porque depois deste resultado, tem meio quase um pé no Tour do próximo ano, caso saiba gerir o resto da temporada – e bateu dois campeões mundiais em simultâneo – quatro títulos dentro de água.
À espera dos tubarões
Como diz a WSL, foi mesmo o dia mais feliz da vida de Kikas. Mas não foi só felicidade, foi competência e muita. Foi neste clima de êxtase, que no heat seguinte um tubarão decidiu dar um saltinho e colocar a competição fora de água. Lá dentro estava novamente Julian Wilson, que à saída de água sorria, mas mais de cagaço que de alegria.
Agora, resta esperar o que o dia final nos reserva - pelas previsões pode ser na quinta-feira. Frederico Morais vai ter o luxo de assistir na bancada ao duelo entre Owen Wright e John John na ronda 5. O quadro não ajudou em nada o português, mas estas vitórias são mais saborosas assim. Que graça teria vencer um evento frente a Nat Young ou Kai Otton? Bem, no caso de Portugal até teria alguma, mas não tanta como aquela que poderá acontecer em J-Bay. Que ganhe então o melhor – ou Owen Wright, vá... - para vermos até onde pode ir a mestria de surfista da Linha – perceberam o trocadilho?
Desse duelo vai sair o tubarão – esperemos que só o humano, no sentido figurado - que Kikas vai enfrentar nos seus terceiros quartos-de-final da história numa etapa do WCT. Mas não nos façamos tentar escrever mais sobre isto. Fiquem antes com as imagens e tentam não delirar com o momento que Frederico ofereceu hoje aos fãs do surf nacional.
Desculpa lá Kikas, mas o grande "animal" a surgir no lineup foste tu. Que brutalidade de heat!
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Notícia por SurfPortugal Mag Foto - WSL / Cestari
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